6 de julho de 2011

Crítica | Contra o Tempo

A masturbação mental do ainda “filho do Bowie”
Matheus Lara

. Num estilo esbarrando Christopher Nolan, Duncan Jones nos apresenta “Source Code”, o filme que está alavancando seu nome em Hollywood. Antes de falar do filme, cabe aqui uma proposição rápida sobre o inteligente trabalho do diretor: em Lunar (Moon), de 2009, o excelente roteiro deixa de ser destaque no filme graças ao cansaço do espectador durante o longa – mais ou menos o que aconteceu com Gaspar Noé em Enter The Void (2010) -.


Em “Source Code”, Jones consegue reverter a situação e qualquer pessoa que tenha assistido o filme poderá confirmar que não desgrudou os olhos dele em nenhum momento.
. “Source Code”, que no Brasil foi desnecessariamente chamado de “Contra o tempo”, começa com o Capitão Colter Stevens (Jake Gyllenhall) acordando em um trem, desnorteado, confuso, conversando com uma mulher que ele nunca havia visto na vida, e sendo esbarrado por todas as pessoas que passam no corredor. Após algumas discussões e closes na face atônita de Gyllenhall, uma explosão acontece e todo mundo morre. Basicamente, é isso que vai acontecer ao longo dos noventa e três minutos do filme. Aí entra a ficção bem feita. Stevens acorda (subitamente, ofegante, de ponta cabeça, depois da explosão) dentro de uma cápsula, na frente de uma tela pela qual entra em contato com a Capitã Goodwin, lindamente interpretada por Vera Farmiga. Com o tempo, descobrimos que Stevens está sendo usado pelo governo estadunidense como uma espécie de cobaia para um ambicioso, promissor e futurístico projeto: o Código-Fonte (tradução literal do título), no qual o “voluntário” passaria a viver uma realidade paralela que daria a ele a chance de literalmente encarnar uma outra pessoa em seus últimos oito minutos de vida. Tendo isso, a missão de Gyllenhall é, além de se redimir pelo fiasco “Prince Of Persia: The Sands Of Time” (2010), descobrir onde está a bomba que vai destruir o trem, quem a colocou lá e impedir que o terrorista consiga executar um próximo ataque. Tudo isso em oito minutos. O legal é que toda vez que ele morre (dentro dos oito minutos), ele volta para a sede do Código-Fonte e conta tudo que vê para a Capitã Goodwin, que o orienta em sua volta ao mundo da explosão.
. O filme faz uma dura crítica ao sistema militar, no sentido de levantar questionamentos sobre o limite do “honrar o país” e do “morrer pela pátria”. O sofrimento de Capitão Stevens fica muito bem marcado em cada volta que faz após cada oito minutos. Outra crítica que se faz no filme atenta para o desenvolvimento de novas tecnologias: participação sem consentimento, exposição ao risco de vida e a velha discussão de quanto sacrifício tem de haver para que se evolua uma tecnologia.
. Após o catastrófico “Prince Of Persia: The Sands Of Time”, Jake Gyllenhall deixou muita gente com um pé atrás quando foi anunciado como protagonista de mais um filme de ação. O eterno Donnie Darko precisava se redimir. E não faz feio em “Source Code”. Muito pelo contrário, pode-se considerar que a surpresa do filme, antes da bom trabalho do diretor de Moon, é justamente a atuação de Jake Gyllenhall, que convence como o desnorteado Capitão Stevens. As cenas de lutas conseguem demonstrar bem essa característica tensa do personagem, que briga com tudo e todos para conseguir de uma vez completar sua missão.
. Vera Farmiga é a melhor em cena. Seus grandes olhos traduzem ao mesmo tempo a preocupação com Capitão Stevens e o compromisso com seu trabalho. É a atriz certa para a personagem certa.
. Os problemas de “Source Code” ultrapassam o limite das filmagens. O filme, por si só, é bom, mas houve um erro enorme na produção do trailer e na divulgação. Qualquer um, sem ter visto o filme, mas com um conhecimento prévio sobre ele, espera um trabalho comparável aos filmes recentes de Christopher Nolan.

E infelizmente não é o que acontece. O enredo deixa dúvidas demais no ar, e o trabalho com temas como mecânica quântica e realidades paralelas não é claro o suficiente para um diretor que quer marcar seu nome em Hollywood. Por isso, outro problema do filme acaba sendo a pouca duração. Talvez pelo trauma de Lunar, Duncan Jones tenha preferido pecar pela falta ao excesso. Melhor seria ter falado tudo que precisava.
. Outro sério problema do filme são os efeitos especiais. Desnecessários e estranhos. Na verdade, não pode-se culpar os diretores de arte do filme. Até porque o longa é uma ação muito mais cerebral do que física. Só que, mais uma vez, o trabalho de divulgação do filme causou certa decepção também neste quesito “efeitos”.
. O pior de “Source Code” vem do inexplicável e desnecessário romance que pinta durante o longa. De repente, Stevens se vê apaixonado pela personagem de Michelle Monaghan, Christina Warren, alguém que ele nunca tinha visto na vida. Realmente inexplicável... Por sorte, este romance não dura mais que o tempo para você apenas não entender o motivo dele existir.
. Por fim, “Source Code” é um filme bom e legal de se assistir. Corrido como poderia não ser, mas ainda assim um bom filme para se desligar do dia-a-dia. E fica a atenção voltada para Duncan Jones. Se ele não ficar novamente traumatizado , –agora pelos erros de “Source Code”- logo logo ele deixará de ser apenas o“filho do David Bowie”.

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